Máscaras sociais: quem somos sob elas?


Foto de Наталия Котович:Pexels


Vivemos em uma sociedade onde mostrar-se tornou mais importante do que ser. Desde a infância, somos ensinados a vestir "máscaras sociais" — papéis que moldam nosso comportamento, nossa aparência e até nossas opiniões, dependendo do ambiente, do grupo e da expectativa dos outros. Embora essa adaptação social seja, em muitos casos, necessária para a convivência, ela se torna um problema quando deixa de proteger e passa a aprisionar.

Sob as máscaras, muitas vezes, escondemos inseguranças, medos, dores e verdades. Mas o que acontece quando deixamos de reconhecer quem somos sem elas? O quanto dessa “persona” é realmente nossa, e quanto é moldado pela necessidade de aceitação?


As redes sociais e a era da performance

Se antes as máscaras estavam restritas a círculos sociais físicos — como a escola, o trabalho, a família —, hoje elas ganharam um palco global: as redes sociais. Plataformas como Instagram, TikTok e Facebook se tornaram vitrines onde a vida precisa parecer perfeita, plena e bem-sucedida o tempo todo.

Essa constante exposição intensificou o culto a padrões irreais de beleza, riqueza, produtividade e felicidade. Corpos esculpidos, viagens de luxo, relacionamentos românticos idealizados e vidas “sem defeitos” se tornaram a norma — mesmo que, na realidade, sejam construções cuidadosamente editadas.

Essa lógica cria um ciclo perigoso: para ser aceito, é preciso se parecer com aquilo que se vê. E o que se vê, na maioria das vezes, é uma ilusão. Assim, muita gente passa a viver não para si, mas para manter uma imagem. Uma máscara social digital, atualizada diariamente com filtros, legendas e sorrisos forçados.


O peso de tradições e discursos religiosos moralistas

Além das redes, outras máscaras são reforçadas por tradições culturais e crenças religiosas que já não dialogam com a complexidade dos tempos atuais. Muitos ainda são pressionados a seguir modelos familiares rígidos, papéis de gênero antiquados, comportamentos "respeitáveis", dogmas morais que desconsideram a diversidade de experiências humanas.

O discurso religioso, quando moralista e excludente, amplia esse sufocamento: dita o que é “certo” ou “errado” com base em julgamentos e não em empatia. Pessoas são ensinadas a reprimir sua sexualidade, esconder suas dúvidas, negar sua individualidade para serem aceitas por uma suposta "verdade divina" que, muitas vezes, serve apenas para manter estruturas de poder.

Essas máscaras, reforçadas pelo medo da rejeição ou da culpa, fazem com que muitos vivam desconectados de si mesmos, buscando ser quem nunca foram — apenas para agradar, sobreviver ou se encaixar.


O custo emocional de não ser quem se é

Quando a máscara se torna mais real que o rosto, surge o sofrimento. A pessoa sente que está vivendo um papel, e não uma vida. O esgotamento emocional, a ansiedade, os distúrbios de imagem, a depressão e até o adoecimento físico são consequências frequentes desse desencontro entre o que se mostra e o que se é.

A verdade é que somos muito mais do que os papéis que desempenhamos. Somos contraditórios, imperfeitos, múltiplos. Tentamos nos proteger com máscaras, mas, ao usá-las por tempo demais, esquecemos como é viver com o rosto descoberto.


Quem somos sob as máscaras?

A resposta não é simples, nem está pronta. Sob as máscaras, há um ser em construção — vulnerável, mas cheio de potência. Alguém que deseja ser aceito como é, sem precisar se mutilar para caber no molde.

É preciso coragem para iniciar esse processo de desconstrução. Reaprender a ouvir a si mesmo. Reconhecer as máscaras que usamos por proteção, mas também aquelas que vestimos por medo, vergonha ou conveniência. E, aos poucos, libertar-se delas.


O caminho da autenticidade

Buscar a autenticidade não é abandonar todos os papéis sociais, mas aprender a não se perder neles. É cultivar espaços e relações onde se possa ser verdadeiro. É resistir à pressão de parecer perfeito, bem-sucedido ou “normal”.

Algumas práticas podem ajudar nesse caminho:

  • Autoconhecimento profundo: através da escrita, da arte, da terapia ou da espiritualidade, podemos acessar camadas mais verdadeiras de nós mesmos.

  • Consumo consciente de redes sociais: lembrar que o que se vê online é editado e que comparação constante é tóxica.

  • Questionamento de padrões herdados: refletir sobre o que faz sentido para você, e o que apenas foi imposto.

  • Círculos de confiança: criar ou buscar espaços seguros, onde seja possível falar com verdade e ser acolhido sem julgamento.


Conclusão: despir-se é um ato de coragem

Despir-se das máscaras é, antes de tudo, um gesto de respeito consigo mesmo. É dizer: “Eu sou suficiente, mesmo quando não sou perfeito”. É escolher viver com mais verdade, mesmo que isso implique contrariar expectativas.

Numa sociedade que valoriza tanto o “parecer”, ser é um ato de resistência. E mais do que nunca, precisamos de pessoas reais, inteiras, imperfeitas — mas humanas.


Referências bibliográficas:

  • Goffman, Erving. A Representação do Eu na Vida Cotidiana. Vozes, 2008.

  • Brown, Brené. A Coragem de Ser Imperfeito. Sextante, 2013.

  • Bauman, Zygmunt. Modernidade Líquida. Zahar, 2001.

  • Sibilia, Paula. O Show do Eu: a intimidade como espetáculo. Nova Fronteira, 2008.

  • Jung, Carl Gustav. O Eu e o Inconsciente. Vozes, 1981.

  • Rocha, Everaldo. Cultura, Consumo e Identidade. Pioneira, 2006.

  • Instituto DataSenado. Redes sociais e saúde mental no Brasil, 2023.


Quantas vezes você precisou vestir uma máscara social? Como se sentiu? Deixe aqui o seu comentário!


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